CEOs, startups e foguetes
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Sou CEO há muito pouco tempo. Mas, já senti uma coisa que tenho certeza que só piora com o tempo: ter cada vez menos tempo para "deep thinking" - pensamento aprofundado. Muito rápido ouvi algumas regras básicas para CEO que já sinto que me distraíram do que é mais importante. Por isso, resolvi escrever um pouco sobre algumas analogias que ouvi e dificuldades que passo agora.
Pra começar, primeiro tenho que falar de foguetes.
No mundo da astronáutica, dois elementos essenciais são necessários para fazer um foguete voar até o espaço: combustível e oxidante. O combustível é a fonte de energia, enquanto o oxidante faz com que o combustível queime de forma eficiente no espaço.
Mas, os mesmos elementos que propulsam o vôo também carregam um risco intrínseco de explosão. O combustível e o oxidante, enquanto cruciais para gerar a força necessária para escapar da gravidade terrestre, formam uma mistura química altamente reativa. Sob condições normais, essa reação é controlada e direcionada para fornecer propulsão. No entanto, se algo der errado - seja por falha mecânica, erro humano ou outra causa - essa mesma mistura pode levar a explosões. Essa volatilidade exige um design meticuloso, testes rigorosos e protocolos de segurança estritos. A gestão cuidadosa desses elementos explosivos é crítica pra garantir o sucesso e a segurança de qualquer missão espacial.
Dias atrás ouvi do Michael Seibel, partner da Y Combinator, um paralelo muito bem traçado disso com startups. Pessoas como combustível e dinheiro como oxidante. Sem pessoas, não saímos do lugar. Não ganhamos velocidade, não conquistamos novos horizontes, não pensamos em ideias novas. Sem dinheiro, pessoas não conseguem executar o que precisam, não são otimizadas, não têm o recurso que precisam pra dar novos passos. Como com foguetes, o equilíbrio consciente entre esses dois elementos para um lançamento e uma jornada de sucesso é crítico. Errou na proporção, a coisa explode. Pessoas demais, dinheiro demais, pessoas nos lugares errado, dinheiro investido nas frentes erradas, vem a explosão.
Mas uma coisa me chamou mais a atenção dessa analogia além da parte óbvia. Já ouvi de algumas pessoas que CEOs têm duas missões: garantir pessoas e dinheiro para a empresa. "Foca nisso que tudo vai dar certo”. Nessa brincadeira de focar só nisso, falta o fator principal: deep thinking / pensamento aprofundado. Achar que, como CEO, sua única missão é trazer pessoas e dinheiro, vai aumentar bastante a sua chance de criar uma explosão. Até porque, no fim do dia, você só está jogando os dois elementos na nave, e não pensando na sua proporção certa, não sendo analítico e tomando tempo e massa cinzenta pra pensar nas coisas que levam horas, dias, meses pra concluir.
Assim como um gestor de engenharia tem que saber codar, um CEO tem que saber pensar, pra tomar decisões. Essa é a primeira função. Vem antes de pessoas e dinheiro. Pensar, com profundidade. Afinal, algumas das principais funções práticas são comunicar visão, objetivos, OKRs, relacionamento com stakeholders e decidir quem eles são, definir os principais focos, entender quais áreas são mais importantes em cada momento. É desenhar o foguete antes de receber os insumos e depois, controlar a direção, tomar riscos, mudar o prumo.
Saber pensar não é fácil. O cérebro humano é condicionado para pegar tarefas pequenas para fazer e se satisfazer. Uma reunião de alinhamento, uma decisão financeira, um papo com um fundo de VC. Isso vai se empilhando e deixando pouco ou nenhum tempo para pensar para onde o produto deve ir, para conhecer melhor o cliente, para entender outros mercados, para falar com o time, para avaliar a cultura. E fazer isso com profundidade, não em um papo de 15 minutos com um executivo que você acabou de contratar.
Uma coisa é certa: mesmo sendo CEO há pouco tempo, já percebi que pensamento aprofundado evita explosões.